'Precisamos de uma tranquilidade civilizada', diz senadora sobre crise política


Isto É

Senadora Ana Amélia (PP/RS) - Foto: Isto É

A senadora gaúcha Ana Amélia Lemos (PP-RS), 71, ganhou notoriedade como uma das mais ativas vozes de oposição ao governo do Partido dos Trabalhadores (PT), legenda que considera ter cometido o maior dos pecados políticos:

Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária e vice da Frente Parlamentar de Agricultura no Senado, ela afirma, em entrevista à revista Isto É, que o PT fomenta as manifestações contra o presidente Michel Temer e defende a postura que a polícia tem adotado na repressão aos protestos.

"Certamente, não é entregando rosas para quem incendeia, destrói e pratica atos de vandalismo com interesse criminoso que a polícia deve lidar com manifestações", diz. Ainda segundo ela, o fatiamento do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff abriu um precedente para que outros possam escapar da inelegibilidade, caso do deputado Eduardo Cunha e do ex-senador Delcídio do Amaral.

Isto É - Seu partido, o PP, tem alguns envolvidos na operação Lava Jato e não pretende questionar a decisão que manteve os direitos políticos da ex-presidente Dilma Rousseff.

Ana Amélia - É legítimo questionar o equívoco que foi cometido. Nós seguimos, em grande parte, a experiência com o julgamento do ex-presidente e agora senador Fernando Collor (PTC-AL). O mesmo ato que cassava o cargo também cassava os direitos políticos, mantendo a inelegibilidade por oito anos, como foi aplicado a ele (em 1992). Eu entendi que houve, agora, um conluio entre uma parte do PMDB com apoio do PT para jogar uma boia para o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está para ser julgado.

Como a senhora analisa as manifestações contra o governo Temer iniciadas assim que o Senado votou o impeachment da ex-presidente Dilma?

AA - Quando o Senado decide por maioria, a minoria tem que aceitar, acatar e respeitar. Essa história de falar que ela teve 54 milhões de votos tem relevância apenas no discurso político. O que aconteceu nesse impeachment, além dos crimes cometidos por uma gestão absolutamente temerária e irresponsável, com consequências gravíssimas para o País, foi também a clara percepção de que um partido tomou o poder como se o País lhe pertencesse. Esse foi o maior pecado cometido pelo Partido dos Trabalhadores. E o preço foi o afastamento. Não adianta os líderes de partido estarem, agora, se queixando e se vitimizando.

Eles têm falado que há um antipetismo…

AA - Esse clima antipetista foi plantado pelo PT ao longo da sua história, por se considerar melhor, mais honesto, mais puro e mais responsável que todos os demais partidos. E entraram no poder com o único e exclusivo objetivo de se perpetuar no poder. Só que não conseguiram enganar a todos o tempo todo. A saída de Dilma Rousseff é também a penalização desses objetivos absolutamente impróprios. A reação desses grupos não se justifica. Não é possível que aceitemos essa reação radical. Esse é um ato de irresponsabilidade.

Na sua opinião, todas essas manifestações têm sido fomentadas pelo PT?

AA - É ele que estimula. Ele que lançou esse discurso de golpe. Foi ele que criou essa radicalização ativando o que o Lula tinha chamado de "seus exércitos". Golpe foi o que eles deram no Brasil. Veja o último escândalo dos fundos de pensões, veja a destruição da Petrobrás. É contra tudo isso que a sociedade brasileira está reagindo indignada, por ver o dinheiro da população dilapidado de maneira criminosa. Felizmente, nós temos a figura do judiciário. Eu acho que o Sérgio Moro (juiz da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba), além de outros magistrados como ele, tem se posicionado com suficiente independência para colocar fim nesse tumor que consumiu as riquezas do Brasil. Temos que estimular o Ministério Público e o Poder Judiciário a realizar o trabalho deles de maneira independente. Tentar obstruir a Lava Jato foi um ato criminoso percebido pela sociedade para tentar evitar que haja a penalização e a investigação rigorosa pelos atos praticados contra os interesses do povo brasileiro.

A polícia tem sido criticada pela violência contra os manifestantes. Como a senhora acha que ela deve lidar com esses movimentos?

AA - Certamente, não é entregando rosas para quem incendeia, destrói e pratica atos de vandalismo com interesse criminoso, que a polícia deve lidar com manifestações. Tem que ser com base na lei.

A senhora já conseguiu marcar reunião com o presidente Temer?

AA - Todas as reuniões que nós tivemos foram sempre coletivas, sobre obras interrompidas de interesse do estado do Rio Grande do Sul. Tenho ido ao Palácio do Planalto para prestigiar um ministro que seja também senador, como foi o caso do Blairo Maggi quando lançou o programa Agro Mais.

Por que a senhora recusou, em maio, o convite para assumir o Ministério da Agricultura?

AA - Porque, como membro de uma comissão que investigava o impeachment, não poderia dar algum sinal de que defendia interesse no governo. Seria incoerente estar na comissão e no governo.

O que acha da redução do teto da dívida para os estados, em pauta no Senado?

AA - Essa é uma pauta importante. Hoje o Brasil vive uma crise federativa causada por várias distorções das relações entre a União, os estados e os municípios. A União é a prima rica da Federação, os estados são os remediados, e os municípios os primos pobres. Eu enviei uma PEC aumentando em 2% a receita advinda do fundo de participação dos municípios, que são os impostos de renda e o IPI. O governo da ex-presidente Dilma aceitou a minha emenda, mas aumentou em apenas 1%. Se alguns estados importantes como o Rio de Janeiro, o Rio Grande do Sul e outros, não conseguem honrar suas folhas de pagamentos, imagine os municípios.

A senhora tem planos de deixar o Partido Progressista?

AA - Eu nunca cogitei sair do partido. Essa especulação se deu (no ano passado) pelo fato de muitos parlamentares do Partido Progressista estarem envolvidos na Lava Jato. Eu não tenho compromisso com erro. A minha regra moral é a mesma para o meu adversário e o meu aliado. Não seria ético de minha parte acusar os outros e não reconhecer os erros da minha própria casa. O que eu disse é que "quem deve, tem que pagar pelos erros cometidos, não há complacência". Mas é claro que o PSD me convidou, o PRB me convidou, vários partidos me convidaram. Mas eu nunca disse que sairia.

Eventos como a Olimpíada e a Paralimpíada podem trazer de volta o espírito de união para os brasileiros?

AA - Eu preferiria que nosso País retornasse ao ritmo de cada um fazendo o seu dever, acho que é isso que precisamos agora, de um clima de tranquilidade civilizada. Não podemos tolerar o vandalismo, a destruição, simplesmente pelos grupos que se sentirem ameaçados de perder o poder. Eles precisam respeitar a maioria pelo que rege a Constituição brasileira.

Qual sua visão sobre a presença feminina na política?

AA - Hoje o Senado já tem mais de 10% de mulheres. Eu acho que é um ganho. Mas a política é de muita exposição. Você tem uma cobrança muito grande. Se você olhar nas carreiras de Estado, você vai encontrar um aumento extraordinário (no número de mulheres). Teremos, agora, uma mulher presidindo o Superior Tribunal de Justiça e a Suprema Corte do País. No Rio de Janeiro, 53% dos inscritos em concursos para juiz são mulheres. Naquilo que o seu ingresso depende de concurso público, as mulheres estão conseguindo entrar porque são aplicadas. Na política, os partidos são obrigados a terem pelo menos 30% de candidatas mulheres – embora eu considere isso uma cota fictícia. Muitas são pessoas que não têm condição, mas como é necessário, fazem de conta que estão competindo. Então, é preciso que as mulheres que entram na política, o façam por vontade.


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